Capítulo 28

492palavras
Mainha me deu ordens para que eu ajudasse as mulheres que estava na cozinha a servir a comida para aquele povo todo. Pelo menos assim eu me distraía e parava de pensar em Allan e onde ele havia se enfiado. Bentinho encostou na pia e eu fui logo enchendo ele de perguntas:
— Quem avisou ao Allan sobre o Jacob?
— Diacho! – Exclamou, batendo a mão na própria testa – me desculpe. Eu liguei para ele ontem à noite por ordens de painho e esqueci de avisar que ele estava voltando.

— Que leseira, Bentinho – eu o recriminei, com carinho – essas coisas a gente não tem que esquecer, visse. Mas está desculpado.
— E antes que me pergunte – falou – ele saiu com painho. Foram lá para o cemitério preparar o túmulo de Jacob.
Então ele virou as costas com um copo cheio de água na mão. Nem três passos deu, virou-se a mim novamente e falou:
— Ele ainda ama você.
Então, no meio de tanta dor, eu sorri.
3

É hora de dizer adeus
A tarde já caía quando painho chegou com um carro para levar o corpo de Jacob. Allan não estava com ele. Não queríamos prolongar a despedida, nem a dor. Então decidimos enterrá-lo naquele mesmo dia. Mainha se recusava a comer, dizia que nada descia, mesmo que eu insistisse. O máximo que consegui foi fazê-la tomar um copo cheio de suco de laranja. Dizia eu, que ela precisava estar forte para ver seu filho pela última vez.
Então foram todos para o cemitério de Noronha. Um cortejo enorme, a maioria daquelas pessoas eram curiosos. Muitos outros ficaram horrorizados com a morte precoce de Jacob. O último homicídio em Noronha havia sido em 2012.
Então vi Allan novamente. Vestia uma roupa preta. As mãos no bolso da calça, cabeça baixa, observando o sepulcro que em breve receberia o corpo do meu irmão. Seus cabelos cacheados caiam pelo rosto e me fez lembrar daquele Allan da infância, tão lindo. Meu coração acelerou quando ele percebeu a aproximação da multidão e olhou para mim. O seu olhar ainda era o mesmo de quando ele disse que me amava. Então a multidão ficou entre nós dois. O padre da igreja do arquipélago falou umas palavras, desceram o caixão. Mainha chorou de um lado, painho do outro. Eu chorei pelos dois. Allan continuava olhando para mim e eu ainda tinha impressão de que quilômetros nos separavam. Inevitavelmente me lembrei da última mensagem, do adeus que não houve. Das suas palavras duras. Lembrei dele desistindo do nosso amor. Então a alegria foi embora e uma mágoa enorme invadiu meu coração.

Como eu seguiria fingindo que nada estava acontecendo, quando o Allan agora estava aqui, trazendo de volta na bagagem toda a nossa história? Pensar no que não vivemos me faz querer chorar. Eram tantas possibilidades, tantos sonhos que ele avisou pela janela. Agora voltava, como se nada tivesse acontecido.
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